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terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Exemplo de Candiota-RS...

Prefeito e deputado acreditam em decisão favorável do Ministério da Saúde sobre cubano que atendeu emergência



Paulo Argollo, presidente do Simers, disse que o caso não era grave, mas dias depois o paciente morreu

 por Conceição Lemes no VIOMUNDO

Candiota fica a cerca de 400 quilômetros de Porto Alegre (RS), população estimada em 10 mil habitantes e uma peculiaridade: possui 32 assentamentos de reforma agrária e várias comunidades quilombolas.
Até o início de janeiro, provavelmente poucos fora do Sul do Brasil tinham ouvido falar desse município gaúcho, na faixa de fronteira.
Foi quando então ganhou destaque na mídia nacional.
O médico cubano Maikel Ramirez Valle,  do Programa Mais Médicos, foi  denunciado pelo Sindicato Médico do Rio Grande do Sul (Simers) por atender um paciente em estado grave no Hospital de Candiota. Pelo contrato,  os participantes só podem atuar  em unidades de atenção básica dos municípios.
Candiota tem sete médicos, apenas um reside na cidade. É justamente Maikel Ramirez Valle, o único credenciado no Programa Mais Médicos.
Tudo aconteceu em 2 de janeiro.
O médico escalado para o plantão tinha ido a Bagé acompanhar um paciente, e o substituto atrasou-se. Deveria entrar às 8h, chegou às 9h15.
Nesse período, um doente grave chegou ao hospital. Como não havia outros médicos no município naquele horário, Valle foi chamado em casa para atender o caso.
“A Secretaria de Saúde foi comunicada que não havia médico para realizar o atendimento. E, devido ao risco de morte, solicitada a autorização para que o profissional do Mais Médicos o fizesse”, conta ao Viomundo  o prefeito Luiz Carlos Folador. “Ao perceber a urgência do quadro, ele encaminhou o paciente para o pronto-socorro da Santa Casa de Bagé, com maior estrutura e referência para a nossa região.”
Em Bagé, o médico responsável pela internação percebeu que a requisição não continha o número do registro profissional e denunciou o caso ao Simers, cujo presidente é Paulo de Argollo Mendes. Ele está  há 16 anos no poder, sempre foi contra a vinda de médicos estrangeiros, embora tenha dois filhos formados em Medicina, em Cuba.
Ao Jornal Minuano, Argollo disse: “A informação que nós temos é de que não tinha nenhum médico atrasado. Outra informação que chegou até nós é de que o quadro do paciente não era tão grave”.
O caso era grave. Tanto que, depois de alguns dias internado na Santa Casa de Bagé, o paciente morreu, mostrando o encaminhamento correto do médico cubano.
Quanto à outra acusação de Argollo – a de que não havia médico atrasado –, Folador afirma: “Realmente, o plantonista estava atrasado. Está tudo relatado e comprovado na defesa que encaminhamos ao Ministério da Saúde”.

“Desde o primeiro momento, o presidente do Simers não estava preocupado com o fato em si, com a verdade. Só queria achar um motivo que pudesse desmoralizar o programa Mais Médicos”, diz o deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS). “O Simers  e o seu presidente sempre se posicionaram abertamente contra o programa.”
O futuro do médico cubano e de Candiota no Programa Mais Médicos está na berlinda. A decisão final do caso deve sair nos próximos dias.
Perguntamos ao prefeito Luiz Carlos Folador o que significa para Candiota perder o doutor Maikel Ramirez Valle e o eventual descredenciamento do município do Mais Médicos.
“Não contamos com essa possibilidade. Confiamos na sensibilidade do Ministério da Saúde, pois foi, de fato, um caso excepcional, isolado, e já comprovamos isso. Não temos nenhum médico morando em Candiota, a exceção é o profissional do Mais Médicos. A quantidade de médicos em nossa cidade não é suficiente. Nosso Pronto-Atendimento recebe pessoas de outros municípios que veem trabalhar aqui. Também temos núcleos de famílias assentadas e comunidades quilombolas”, analisa Folador.  ”O descredenciamento seria uma perda irreparável, seria o maior dos prejuízos.”
Paulo Pimenta também acredita numa decisão favorável: “Não vamos permitir que posições corporativistas busquem contaminar e confundir a opinião pública sobre o Mais Médicos, que, além de requisitar profissionais estrangeiros, também está fazendo investimentos em infraestrutura e ampliando os cursos de graduação em medicina no país”.

O exemplo de Rosário do Sul...

A garota é da RBS. As contas, da Prefeitura

Bibiano Girard*, especial para o Jornalismo B

Na edição de quinta-feira passada do Jornal Gazeta de Rosário, que circula pela cidade da região da Campanha do Rio Grande do Sul, uma manchete chamou mais atenção: “Sem Garota Verão por questões financeiras”. Nela, a secretária de Turismo, Andrea Ribeiro, apresentava à comunidade os motivos pela “quebra de contrato” da prefeitura com o Grupo RBS para a realização da fase regional do concurso de beleza promovido pelo canal, o Garota Verão.
Não bastasse a RBS abocanhar gigantescos faturamentos em publicidade do governo, ou seja, com impostos nossos, o grupo ainda se utiliza de uma prática de barganha com pequenos municípios, como é o caso de Rosário do Sul. Apontado pela Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), entre 5.226 cidades brasileiras pesquisadas, como o município com pior desempenho fiscal no Rio Grande do Sul, a cidade, até dois anos atrás, mantinha um gasto exorbitante nos meses de verão com a confecção do concurso difundido pela RBS.
conta
A incoerência de um canal de televisão, abalizado pelo Grupo, ultrapassa o senso do jogo limpo de mercado. Em 2009, convocada pelo procurador do Ministério Público Pedro Antônio Roso, uma audiência escancarou o óbvio: no papel, o grupo diz ter dois canais de TV por CNPJ. Na prática, são 12 os CNPJ que transmitem o mesmo conteúdo. E esse poder todo é utilizado como propaganda de autorreferência, o que traz receita. É uma vulgar propaganda e é convidativa a políticos e a prefeituras alucinadas por espetacularizar.
Há de se comentar o bom exercício da secretaria de turismo de Rosário do Sul, Andrea Ribeiro: a secretária deixou muito claro, na entrevista ao jornal local, os motivos pela escolha sensata e socialmente inteligente pela quebra com a RBS. Os motivos são gritantes e parecem ser os mais claros para receber apoio popular. “O valor pago pelo município na Fase Regional seria de R$ 60 mil”. A prefeitura decidiu gastar o valor em esporte.
É só passar na Praia das Areias Brancas, bairro do município à beira do Rio Santa Maria, para compensar a dúvida: entre sexta e domingo, jogos movimentaram o bairro, trouxeram real interesse popular na utilização do espaço e não discriminam ninguém colocando poucos sobre palcos, entre câmeras e apresentadores de TV. É só passar na praia e conferir os jogos, com público de todas as idades, esportistas de cidades da região e de Rosário, adultos, jovens e crianças. Na plateia, turistas de fora e comércio popular aquecido.
“A prefeitura sugeriu que gastar isso em um evento de apenas um dia seria desnecessário”. Segundo a reportagem, Andrea afirmou o que, para mim, chegou a assustar: “R$ 60 mil era apenas o valor prefixado e os gastos excediam esse preço”. Agora vem a parte bruta: “esperávamos a RBS com toda a estrutura de palco, som, luz e coquetel (privativo), que possuía um valor elevado. Em caso da candidata ser selecionada, a Secretaria a acompanhava em todas as fases do concurso, chegando a gastos de mais de R$ 100 mil. Resolvemos levar esse valor para outros fins, como o esporte.” A questão que fica é a seguinte: no final das contas, quem ganhava com a audiência? Prefeituras pagam o custo. É banal e vergonhoso.
Podemos dizer que a RBS não obriga ninguém a promover o concurso, muito menos seria uma política da empresa forçar prefeituras a apostarem em seu concurso. Ledo engano, é aí que mora a ironia dos monopólios: se a RBS monta um aparato gigantesco de autopublicidade e autorreferencialidade nos meses de verão para vender seu concurso, o espaço de publicidade às cidades é chamativo. Resta o bom senso, como da secretária de Rosário, que prezou por elevar o número de atividades esportiva e culturais na praia – para todos.
Se a cidade investe mais de R$ 100 mil para aparecer na TV através do concurso, logo, nossos impostos, somados os 100 mil, viram nada mais nada menos do que patrocínio à empresa. Se é valor economizado pelo Grupo, e mesmo assim sua audiência se mantém sobre o espetáculo criado, não deixa de ser patrocínio. Pago por nós. E dos gordos. Se não cabe (?) questionarmos a empresa pela prática, que se utiliza de leis sujas do mercado percebidas como naturais, a crítica e o questionamento de nós, cidadãos, deve se encaminhar às prefeituras, que devem priorizar o interesse público: é num concurso de beleza que queremos utilizar R$ 100 mil reais de nossos impostos? É para patrocinar um programa de televisão de um dia na rede de televisão mais rica do sul do país que pagamos estes impostos? Precisamos discutir nossa carga tributária, sim. Mas junto, deve estar nossa discussão mais banal: para onde queremos direcionar nosso caixa? É cargo da população dizer que suas prioridades não são uma faixa, uma mulher de biquíni e um buquê de flores.

*Jornalista, redator da revista o Viés.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

O corporativismo do CFM contra os pobres sem atendimento....

Médicos cubanos: pode criticar, mas não é trabalho escravo

Acima de tudo, isso é falta de contato com a realidade e de respeito com quem realmente está nessas condições e precisa ser resgatado para ter sua liberdade ou dignidade de volta


Leonardo Sakamoto,

Se considerarmos que a condição dos médicos cubanos que estão sendo trazidos ao Brasil é de trabalho escravo contemporâneo, como querem fazer crer alguns contrários ao programa Mais Médicos, também teremos que incluir nessa conta milhões de trabalhadores do agronegócio, da construção civil, dos serviços que recebem salários abaixo do piso ou do mercado. O governo cubano deve receber os recursos das bolsas de R$ 10 mil e repassar parte delas aos seus médicos no Brasil.
Renato Bignami, responsável pela fiscalização de casos de escravidão em São Paulo, analisa que, a princípio, os elementos do novo programa do governo federal não caracterizam trabalho análogo ao de escravo. Se considerarmos que configuram a priori, parte do trabalho no Brasil seria escravo. Ou seja, um desconhecimento do artigo 149 do Código Penal, que trata do tema, e da jurisprudência em torno dele.
E os fiscais do trabalho já viram muita gente, inclusive escravos envolvidos em processos do próprio governo federal, como na produção de coletes para recenseadores do IBGE, em obras do Minha Casa, Minha Vida, do Programa de Aceleração do Crescimento, do Luz para Todos…
Ganhar pouco ou mesmo estar em condições precárias de trabalho são coisas diferentes de trabalho escravo. Estampar algo como “trabalho escravo” pode ser útil para dar notoriedade a um argumento, uma vez que é um tema grave e que gera repulsa por parte da sociedade. Mas, por isso mesmo, deve-se tomar muito cuidado ao divulgá-lo, que é o que os jornalistas que cobrem o tema tentam fazer o tempo todo. Saibam que muita coisa fica de fora porque não se sustenta.
De acordo com o artigo 149, são elementos que determinam trabalho análogo ao de escravo: condições degradantes de trabalho (aquelas que excluem o trabalhador de sua dignidade), jornada exaustiva (que impede o trabalhador de se recuperar fisicamente e ter uma vida social), trabalho forçado (manter a pessoa no serviço através de fraudes, isolamento geográfico, ameaças e violências físicas e psicológicas) e servidão por dívida (fazer o trabalhador contrair ilegalmente um débito e prendê-lo a ele).
Não espero que o corporativismo tacanho de alguns representantes de associações médicas entendam isso. Mas o cidadão comum, sim, precisa compreender a diferença.
Uma coisa é a política pública em si, de levar médicos estrangeiros ao interior do Brasil em áreas carentes, que – a meu ver – está correta. Outra é deixar de garantir direitos a grupos de trabalhadores, nacionais ou estrangeiros, o que não pode ser aceito.
Se a lei que sair do Congresso Nacional sobre essa política pública, oriunda da análise da medida provisória encaminhada pelo governo, retirar direitos, ela será inconstitucional. Pois mesmo se o regime de trabalho proposto pela MP for excepcional, ele precisa obedecer à Constituição. Caso contrário, vai naufragar. Simples assim.
Essa adaptação vai acabar ocorrendo via controle de constitucionalidade abstrata, pela Procuradoria Geral da República ou pela Procuradoria Geral do Trabalho, ou via milhares de ações individuais por parte dos próprios médicos envolvidos.
Ao mesmo tempo, é fundamental o Ministério Público do Trabalho monitore qualquer irregularidade que prejudique o trabalhador, fazendo com que o governo respeite a Constituição Federal (principalmente o artigo 7o, que versa sobre os direitos dos trabalhadores), as convenções da Organização Internacional do Trabalho e os tratados de direitos humanos dos quais o país é signatário. Prevenir é melhor que remediar.
“Acho difícil acreditar que a Organização Pan-Americana de Saúde validaria uma experiência com mão de obra escrava”, pondera José Guerra, secretário-executivo da Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo, vinculado à Secretaria dos Direitos Humanos da Presidência da República, lembrando que a vinda de médicos tem a parceira da Opas.
Marcus Barberino, juiz do trabalho da 15a Região e um dos maiores especialistas jurídicos em trabalho escravo contemporâneo, concorda que não é possível afirmar que o programa incorre em escravidão contemporânea. E que é preciso ter muito cuidado com o conceito. ”A proteção contra tratamentos discriminatórios ao trabalho é de âmbito constitucional e não permite tratamento distinto quanto aos direitos fundamentais. Fora da moldura constitucional, todo programa público será revisto pelo Judiciário naquilo que confrontar com a Constituição, que corresponde ao piso civilizatório universal”, afirma.
Como já disse aqui, a gente perde os cabelos, há anos, tentando fazer a bancada ruralista no Congresso Nacional entender que trabalho escravo contemporâneo não é qualquer coisa, como falta de azulejo no banheiro ou salário baixo, mas um pacote de condições que configura uma gravíssima violação aos direitos humanos. E, de repente, pessoas que desconhecem o tema usam-no em proveito próprio.
Como disse um médico amigo meu que conhece bem a fronteira agrícola amazônica e lá trabalhou: se esse povo todo que fala essas groselhas conhecesse o que é trabalho escravo de verdade ou, pelo menos, a realidade dos trabalhadores rurais do interior do país, não teria coragem de fazer esse paralelo absurdo.
Acima de tudo, isso é falta de contato com a realidade e de respeito com quem realmente está nessas condições e precisa ser resgatado para ter sua liberdade ou dignidade de volta.



Leonardo Sakamoto é jornalista e doutor em Ciência Política. Professor de Jornalismo na PUC-SP, é coordenador da ONG Repórter Brasil e seu representante na Comissão Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo.

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

MRV é condenada a pagar R$ 6,7 milhões por infrações trabalhistas e trabalho escravo


A MRV Engenharia, uma das principais empreiteiras do país, está sendo obrigada a pagar R$ 6,72 milhões por infrações que incluem o flagrante de 63 trabalhadores em condições análogas às de escravo nas obras de um condomínio residencial em Americana, interior de São Paulo, em fevereiro de 2011. A construção, que estava sendo executada por uma empresa terceirizada, recebeu financiamento do programa federal “Minha Casa, Minha Vida”. A decisão, de primeira instância, é da juíza do Trabalho Natália Scassiotta Neves Antoniassi e, à ela, cabe recurso. A reportagem é de Stefano Wrobleski, da Repórter Brasil, com informações deste blog:
Fachada da obra da MRV pelo programa "Minha Casa, Minha Vida" em Contagem (MG) onde fiscalização constatou condições de trabalho degradantes (Foto: MTE)
Fachada da obra da MRV pelo programa “Minha Casa, Minha Vida” em Contagem (MG) onde fiscalização constatou condições de trabalho degradantes (Foto: MTE)
De acordo com a sentença, do valor total a que a MRV foi condenada, R$ 4 milhões são por danos morais resultantes do uso de mão de obra escrava. A empresa também terá que pagar R$ 100 mil por dificultar o andamento do processo e da fiscalização.
Além disso, outros R$ 2,62 milhões são decorrentes da multa pelo descumprimento de uma liminar deferida em janeiro de 2012. A decisão responsabilizou a MRV por diversas irregularidades com relação à segurança e saúde do trabalho, além de outras obrigações trabalhistas em duas obras em Americana. A empresa recebeu um prazo de 30 dias para regularizar a situação. Como não o fez, passou a pagar multa de R$ 10 mil por dia. Em novembro de 2012, uma perícia comprovou que a regularização dos problemas apontados pela liminar havia sido feita.
Em nota à imprensa, a MRV declarou que a terceirização de mão de obra é um tema “controverso” e que a empresa já obteve “ganho de causa em processos similares”. Ela informou ainda que está “negociando a assinatura de Acordo sobre Terceirização com o MPT [Ministério Público do Trabalho]” e que deve recorrer da decisão, ao mesmo tempo em que “dará continuidade às negociações com o MPT”.
Através do programa “Minha Casa, Minha Vida”, os bancos públicos Caixa Econômica Federal e Banco do Brasil financiam casas para famílias com renda mensal de até R$ 5 mil. Na sentença, a juíza considerou “no mínimo irônico imaginar que trabalhadores análogos a escravos financiam a moradia de casas populares e que o Estado efetua regiamente os pagamentos referentes a esses contratos”. Além disso, a juíza também autorizou que o Ministério Público do Trabalho envie ofício ao Ministério das Cidades e às Superintendências Regionais e Nacionais da Caixa Econômica Federal e do Banco do Brasil para que se tome ciência da decisão. “O numerário público não pode, mesmo por via indireta, sustentar a manutenção de trabalho escravo”, argumentou.
Trabalho escravo - Além desse caso, a MRV foi flagrada em outras três ocasiões se beneficiando com trabalho escravo. Em 2011, três meses depois do flagrante em Americana, cinco trabalhadores foram libertados em obra da empresa Bauru, também no interior de São Paulo.  No mesmo ano, uma fiscalização em Curitiba (PR) flagrou 11 empregados em condições análogas às de escravo. Em abril deste ano, a construtora foi denunciada mais uma vez por manter seis trabalhadores nessas condições em Contagem, zona metropolitana de Belo Horizonte (MG). No período, a empresa foi incluída por duas ocasiões na “lista suja” do trabalho escravo, mas conseguiu, através de liminar na Justiça, sua retirada.
Na decisão em que determinou o pagamento de R$ 6,7 milhões pela MRV Engenharia, a juíza do trabalho Natália Scassiotta Neves Antoniassi disse ser “frustrante saber que em pleno século XXI tramita pelo Congresso Nacional uma Proposta de Emenda Constitucional visando a extinção do trabalho escravo – a PEC 438/2001”. “Há 12 anos essa PEC sequer foi votada por nossos representantes das casas legislativas, e o principal motivo são os empecilhos colocados pela bancada ruralista, categoria que, segundo relatório da OIT sobre trabalho escravo, é a que mais adota essa prática”, disse. A PEC prevê o confisco de propriedades rurais e urbanas onde tenha sido flagrado trabalho escravo contemporâneo e o seu destino à reforma agrária ou ao uso social urbano.
Histórico - A MRV foi incluída na “lista suja” do trabalho escravo pela primeira vez em 31 de julho de 2012 por conta dos flagrantes nas obras dos condomínios Parque Borghesi, em Bauru, e Residencial Beach Park, em Americana. Às 10h18 do dia 01 de agosto, as ações da MRV chegaram a cair 6,18% na Bolsa de Valores de São Paulo. Depois recuperaram-se um pouco e fecharam em queda de 3,86%. Quando ela obteve decisão liminar favorável e deixou a relação, suas ações recuperaram-se.
Em dezembro, a empresa foi novamente inserida nesse cadastro de empregadores flagrados explorando pessoas em situação análoga a de escravos, mantido pelo Ministério do Trabalho e Emprego e pela Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. O motivo foi o flagrante na construção do edifício Cosmopolitan, em Curitiba (PR).
A “lista suja” tem sido um dos principais instrumentos no combate a esse crime, através da pressão da opinião pública e da repressão econômica. Após a inclusão do nome do infrator, instituições federais, como o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal, o Banco da Amazônia, o Banco do Nordeste e o BNDES suspendem a contratação de financiamentos e o acesso ao crédito. Bancos privados também estão proibidos de conceder crédito rural aos relacionados na lista por determinação do Conselho Monetário Nacional. Quem é nela inserido também é submetido a restrições comerciais e outros tipo de bloqueio de negócios por parte dos cerca de 400 signatários do Pacto Nacional pela Erradicação do Trabalho Escravo – que representam 30% do PIB brasileiro.
O avanço no setor de construção de habitação popular garantiu o crescimento e conquistas. A empresa terminou 2011 como a construtora com maior lucro das Américas, segundo a Economatica, e alcançou o posto de terceira maior construtora brasileira no ranking da ITC, ambas consultorias empresariais que fazem levantamentos sobre o setor. De olho em novos investimentos do governo federal em programas de moradia, o presidente e fundador da MRV, Rubens Menin Teixeira de Souza, defendeu a revisão de valores do programa Minha Casa Minha Vida. Rubens é um dos seis brasileiros incluídos, em 2012, na lista de bilionários organizado revista Forbes.
A ascensão da MRV, porém, tem sido marcada por percalços. Além dos flagrantes de escravidão, a empresa enfrenta questionamentos também relacionados ao que o Ministério Público do Trabalho classifica como exploração irregular sistemática de mão de obra nos canteiros. No primeiro semestre o MPT fez representação inédita acusando a empresa de “dumping social” à Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça (SDE/MJ) solicitando abertura de um procedimento administrativo para apuração do conjunto de infrações que envolvem a empresa no âmbito do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade).

quarta-feira, 10 de abril de 2013

O Brasil que usa crianças como empregadas domésticas



A mudança constitucional que garantiu mais direitos às empregadas domésticas também teve o mérito de ampliar o debate sobre as mais de 250 mil crianças e adolescentes que realizam trabalhos domésticos em todo o país. A situação é relativamente aceita pela sociedade – das “meninas que são pegas para criar” no interior por famílias das capitais, passando pelas filhas das empregadas que vêm “acompanhar a mãe para não ficarem sozinhas em casa” até aquelas que são, de forma surreal, contratadas diretamente para tanto. “Meninas”, sim, pois quase 94% do total explorado são de garotas.
Isso sem contar que, não raro, a família manda o menino estudar e deixa a menina com os afazeres domésticos, conforme relatórios da Organização Internacional do Trabalho. Vemos tudo como normalidade. Para muita gente, o trabalho infantil liberta. Ainda mais quando ele é hereditário.
Posto, abaixo, a boa matéria de Igor Ojeda, da Repórter Brasil, sobre o trabalho infantil doméstico. Vale a pena ser lida.
Pequenas domésticas, violação invisível – por Igor Ojeda
Todos os dias, quando Cristina* acordava, o mundo ainda estava escuro. Era rotina: inclusive aos sábados e domingos, a garota de 12 anos levantava às quatro e meia da madrugada. Não dava tempo de ficar rolando na cama. Tinha de se aprontar logo e ir ao restaurante da tia ajudar com a arrumação. Só três horas depois, por volta das sete e meia da manhã, é que tomava banho para ir à escola.
Na hora do almoço, voltava ao restaurante, onde ficava até as quatro e meia da tarde limpando, ajudando no caixa, fazendo entrega. Mas seu expediente não terminava aí. Retornava à casa da tia e levava mais duas horas limpando, lavando, passando. Depois, jantava, fazia a lição de casa e ia para a cama. No dia seguinte, às quatro e meia, o despertador tocava…
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em setembro de 2011 haviam pouco mais de 250 mil crianças e adolescentes exercendo trabalhos domésticos por todo o Brasil: 67 mil na faixa 10 a 14 anos, 190 mil na faixa de 15 a 17 anos. Apesar de as trabalhadoras desse setor terem alcançado uma vitória histórica recentemente, com a entrada em vigor, no dia 3, da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que garante os mesmos direitos trabalhistas de outros segmentos, o trabalho infantil doméstico ainda carece de visibilidade: especialistas destacam que esse é um problema que, apesar de grave, permanece oculto.
O trabalho infantil doméstico é uma das atividades incluídas na Lista das Piores Formas de Trabalho Infantil (Lista TIP) criada pelo decreto 6.481, assinado em junho de 2008 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva e baseado na Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Constam da relação 89 atividades, com suas descrições e consequências para a saúde de crianças e adolescentes que as desempenham. “Por ter sido incluído na Lista TIP, o trabalho doméstico não pode ser exercido por pessoas que não completaram 18 anos”, explica Isa Oliveira, secretária-executiva do Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (FNPETI).
Mundo escuro – Com o mundo igual de escuro, Cristina acordava, e o martírio se repetia. Alguns meses antes, a pequena pernambucana morava com a mãe, o padrasto e a irmã de dois anos no bairro da Mangueira, no Recife – tinha mais quatro irmãos por parte de pai. Apenas estudava. A mãe, uma moça de seus trinta anos, era doméstica e sustentava as duas filhas com a ajuda do marido, que fazia coleta de sangue numa clínica na cidade.
Foi então que começou a ter problemas de coluna, o que a impediu de continuar trabalhando. Os gastos foram ficando cada vez mais apertados quando veio a “solução”: a irmã do pai de Cristina estava precisando de alguém para ajudá-la em casa e no restaurante. Mandou a filha com mala e tudo para o novo lar, não muito longe dali, também na Mangueira…
Isa Oliveira cita os dados do Censo 2010 para ilustrar a gravidade da situação. Em todo o Brasil, das estimadas 3,4 milhões de crianças e adolescentes trabalhando, 7,5% realizam serviços domésticos. A região Centro-Oeste é a de pior incidência em números proporcionais (9%), seguida das regiões Norte (8,5%), Nordeste (8%), Sudeste (7%) e Sul (6%). Ela chama a atenção, no entanto, para a evidente subnotificação de casos.
“Esses dados não expressam toda a dimensão do problema porque o Censo não coleta informações sobre os afazeres domésticos, ou seja, o trabalho infantil doméstico nas próprias casas das crianças. Há uma dificuldade em relação a esse registro, porque na maioria das vezes não é identificado como trabalho, e sim como ajuda. Como as pesquisas são por autodeclaração, muitas vezes o adulto informa que as crianças não trabalham, porque o conceito de trabalho está ligado à remuneração. Porém, no caso de trabalho infantil doméstico, isso não é determinante, não há essa relação direta”, esclarece a secretária-executiva do FNPETI.
Rotina – Cristina ia caminhando da casa da tia até o restaurante, no Jardim São Paulo, e do restaurante para a casa da tia. Andava também até a escola. Aos sábados, como não precisava estudar, trabalhava o dia todo, até as nove e meia da noite. Aos domingos, cumpria expediente até o meio-dia. Eram poucas as horas livres. Aproveitava para visitar a mãe, mas no mesmo dia à noite tinha de voltar. Afinal, na segunda-feira, às quatro e meia da madrugada… era hora de pegar no batente.
Por todo esse serviço, a menina recebia R$ 20 mensais. Não reclamava. A mãe tampouco, pois pensava que a irmã do pai de sua filha comprava tudo que ela precisava, como roupas novas. Cristina dava metade do que recebia à mãe, e ficava com a outra metade. Quando precisava de mais dinheiro, pedia ao pai. Para completar, a tia e o marido a tratavam mal diariamente. “Me xingavam de vagabunda porque eu não fazia o trabalho direito. Diziam que como estavam pagando, era para eu fazer direito”, conta. A pequena não aguentava mais…
De acordo com a Pnad 2011, do total das crianças e adolescentes no trabalho infantil doméstico no Brasil, 93,8% são meninas. Chama a atenção também o fato de a grande maioria destas serem negras. Tal perfil, no entanto, não surpreende se levadas em conta as características do trabalho doméstico no país, independentemente da idade de quem o exerce. Na realidade, especialistas apontam que grande parte das domésticas adultas começou a trabalhar antes dos 18 anos. Paulo Lago, do Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social (Cendhec), de Recife, explica que a desigualdade social e a miséria são as primeiras causas dessa situação. “A mãe prefere entregar a filha para trabalhar numa casa de família a vê-la morrer de fome.”
Isa Oliveira destaca que tais motivações estão ligadas a outros fatores, como o pouco acesso das crianças à educação de qualidade, principalmente nos pequenos municípios da área rural, e, também, a baixa escolarização dos integrantes adultos das famílias, que não percebem a educação dos filhos como direito e oportunidade. Além disso, há uma forte naturalização do trabalho infantil doméstico no país. “Existe uma espécie de camuflagem da exploração nesses casos. No Nordeste e no Norte, é muito comum crianças serem levadas do interior para casas de famílias nas capitais. A exploração do trabalho fica oculta sob o manto da proteção: ‘a menina veio estudar, tem casa, comida’ etc. É difícil até que a própria família e as crianças compreendam a situação de exploração”, diz Isa.
Violência - Um dia, o marido da tia, um policial, levantou a sandália para Cristina. Mas ela tinha perdido o medo. “Ele ia me bater, mas comecei a xingá-lo, dei um chute nele e fui embora”, lembra. Foi para a casa do avô. A menina continuou indo ao restaurante, mas uma semana depois não apareceu mais. A irmã do seu pai, furiosa, jogou todas suas roupas na rua. Não importava: depois de quase um ano, Cristina estava livre.
Ou quase. No novo lar, continuou a fazer os serviços de casa, para ajudar a esposa do avô. Mas lá a situação era melhor. Era tratada muito bem e recebia R$ 100 por semana. Acordava mais tarde e ia direto para a escola. Mesmo assim, quando voltava na hora do almoço, trabalhava bastante, pois não era “dispensada” antes de lavar a louça do jantar…
Durante o Seminário Internacional Infância e Comunicação, realizado entre 6 e 8 de março deste ano em Brasília (DF), Wanderlino Nogueira Neto, representante brasileiro do Comitê dos Direitos da Criança da ONU, afirmou que em relação ao Nordeste é possível falar até em escravidão nos casos de trabalho doméstico infantil, por causa das condições absurdas a que as crianças são submetidas.
“No Nordeste, infelizmente ainda é comum escravidão no trabalho doméstico, inclusive com castigos físicos”, disse ele, que foi procurador-geral de Justiça da Bahia. “A situação afeta até mesmo familiares. Estamos falando de escravidão mesmo e entre as vítimas estão crianças, incluindo irmãos e irmãs mais novas. É uma situação em que espancamentos são comuns.”
A presidenta da Federação Nacional das Empregadas Domésticas (Fenatrad), a baiana Creuza Maria de Oliveira, sabe bem disso, já que sentiu na pele tais violações desde que começou a trabalhar como doméstica, quando tinha apenas dez anos. “Eu fui vítima de espancamento, de assédio moral, abuso sexual, ato libidinoso… a gente sabe que isso acontece, que no Nordeste as crianças e adolescentes domésticas comem o resto da comida da casa, para não jogar no lixo.” Creuza frisa que as consequências do trabalho infantil doméstico são gravíssimas. A começar pela saúde de quem tem menos de 18 anos, que realizam um tipo de trabalho incompatível com o que seus corpos ainda em desenvolvimento suportam e lidam diariamente com produtos químicos utilizados na limpeza das casas. “Além disso, há o abuso sexual e o assédio moral. A autoestima das meninas fica destruída. Elas crescem com complexo de inferioridade”, alerta. Isa Oliveira, do FNPETI, lembra que a fadiga causada pelo trabalho e jornada exaustivos comprometem não apenas a frequência escolar como também o desenvolvimento cognitivo das crianças.
Educação e saúde - Quando estava na casa da tia, Cristina sempre chegava com sono à escola. Invariavelmente perdia as duas primeiras aulas. No fim do ano, ficou de recuperação em três matérias. Mesmo que tenha trabalhado como doméstica por um período curto se comparado com a média, sua saúde não foi poupada. Por trabalhar muito em pé, seja na residência da irmã do pai ou no restaurante, hoje ela sente fortes dores no joelho. “Cheguei a ir ao médico e ele disse que eu preciso operar.”
Cerca de dois meses depois de ir para a casa do avô, uma vizinha entregou a sua mãe um folheto do projeto “Do trabalho infantil à participação”, do Cendhec, que reúne crianças e adolescentes entre 13 e 16 anos, moradores de comunidades de baixa renda do Recife e com histórico de trabalho infantil, para um processo de formação cujo objetivo é inseri-los nos espaços de formulação de políticas públicas relacionadas aos direitos de meninos e meninas. Cristina preencheu o formulário, fez a inscrição e foi selecionada. Voltou para a casa da mãe e parou de trabalhar…
Paulo Lago, do Cendhec, ressalta um aspecto delicado do problema do trabalho infantil doméstico: muitas vezes, é a própria mãe que põe a filha mais velha para tomar conta dos filhos mais novos enquanto sai para trabalhar – isso quando não chamam afilhadas ou filhas de vizinhos. Por isso, ele defende que é papel do Estado não somente tirar as crianças das situações de trabalho infantil, mas também atuar pelo fortalecimento das famílias de baixa renda, como sua inserção em programas sociais e a construção de creches, para que os pais tenham onde deixar os filhos durante o dia. Creuza, da Fenatrad, destaca que, além das creches, é preciso pensar em escolas de tempo integral, onde crianças e adolescentes possam, além de estudar, realizar outras atividades, como esportes e cursos de línguas.
Outro grande obstáculo à luta contra o trabalho infantil doméstico, além da precariedade de políticas públicas preventivas, é a extrema dificuldade de fiscalização das situações de vulnerabilidade. “Esse tipo de violação acontece no interior do lar, que é inviolável segundo a Constituição. Por isso é importante que órgãos como Conselhos Tutelares, Ministério Público do Trabalho denunciem esses casos e busquem alternativas e maior divulgação do problema”, diz Isa Oliveira, do FNPETI, cuja campanha contra o trabalho infantil de junho deste ano terá como mote justamente o trabalho doméstico infantil.
Direitos – No projeto do Cendhec desde junho do ano passado, para onde vai todas as quartas-feiras, Cristina aprendeu, na teoria, as consequências do trabalho infantil. Participou de formações, por exemplo, sobre direitos de crianças e adolescentes, atuação dos Conselhos Tutelares e violência doméstica e sexual. Também esteve em oficinas sobre comunicação, para poder exercitar uma visão críticas sobre os meios de informação.
Aos 14 anos, a menina vê sua vida melhorar. A mãe, após um tratamento bem-sucedido, parou de sentir dores na coluna e voltou a trabalhar – faz serviços gerais em uma creche. Cristina não precisa mais ajudá-la. Hoje, a única obrigação é ir à escola.
* Nome alterado para preservar a identidade da entrevistada

sexta-feira, 22 de março de 2013

Prostituição: regulamentar não é a solução



TICIANE NATALE, DA SECRETARIA DE MULHERES DO PSTU-SP



• Nos centros e ruas de qualquer cidade de nosso país, a prostituição é uma realidade. Está diretamente relacionada com a pobreza e a desigualdade, já que se prostituir acaba sendo a única forma de sobrevivência para milhares de pessoas. Ainda que não seja uma atividade exclusiva da mulher, ela é o maior alvo da prostituição. Isso se dá pela localização de superexploração no capitalismo e pela ideologia machista que estimula o mercado da sexualidade a naturaliza a violência inerente à atividade que “de fácil” não tem nada. Discutir o tema interessa à classe trabalhadora, especialmente quando há um projeto de regulamentação da profissão de prostituta.

A vida “nada fácil” da prostituição
Apesar de serem popularmente conhecidas como “mulheres de vida fácil”, a realidade delas é das piores. A violência está presente a todo instante. Não é possível coibir a violência nesta atividade pautada na venda do serviço sexual da mulher que coloca o cliente como dono de seu corpo e de sua sexualidade. O estigma de que são mulheres inferiores ou até objetos e a tamanha privacidade exigida pela prática, às portas fechadas, faz com que a situação possa facilmente sair do controle e, assim, estupros são recorrentes. Numa pesquisa no Reino Unido, 37% das mulheres que trabalham nas ruas do país afirmaram ter sido estupradas nos três meses anteriores à entrevista.

Na verdade, é comum que os estupros sejam vistos como “ossos do ofício” para estas mulheres, assim como agressões e xingamentos. Por vezes, elas são educadas desde crianças a base de socos para se submeterem ao trabalho sexual. Também é frequente que a violência seja utilizada pelos clientes para que as mulheres não usem preservativos, tornando-as vulneráveis a diversas doenças sexualmente transmissíveis. Muitas acabam recorrendo a drogas pesadas e ao alcoolismo para fugir do alto estresse.

Como vemos, a violência física, psicológica, patrimonial, entre outras, são inerentes a este tipo de profissão. A atividade destrói a saúde dessas mulheres. Assim, não é de se assustar que a taxa de mortalidade das mulheres prostituídas seja 40 vezes maior do que a taxa da população em geral segundo a ONG europeia Coalizão contra o Tráfico de Mulheres (CATW na sigla em inglês).

Há também a alienação do próprio corpo, com a sexualidade da mulher submetida às necessidades econômicas de conseguir dinheiro e não servir a seu prazer. Isso faz com que seja reafirmada a ideia de que a mulher é propriedade do homem, sendo apenas um objeto ou pedaço de carne.

Entendemos que a prostituição deve ser abolida, por ter uma opressão e violência inerentes em proveito daquele que pode pagar. No entanto, entendendo-se que tal ordem de coisas só pode acabar no socialismo, qual é a melhor forma de proteger e melhorar a situação das mulheres em situação de prostituição?

Regulamentação não defende a mulher prostituída
O ato de se prostituir é permitido no Brasil, sendo reconhecido como ocupação profissional pelo Ministério do Trabalho e Emprego, mas ainda sem regulamentação. A exploração da prostituição é considerada crime, portanto, é proibida. Os projetos de regulamentação apresentados até hoje no Brasil sempre apareceram como uma alternativa para defender as prostitutas, mas em verdade visam legalizar as casas de prostituição, o incentivo e a facilitação para se prostituir. E não é coincidência que o debate da regulamentação se torne mais forte hoje bem no momento em que grandes empresários fazem planos para aumentar seus lucros com os megaeventos que ocorrerão por aqui, como a Copa do Mundo e as Olimpíadas.

Recentemente, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) propôs o Projeto de Lei 4211/12 (PL Gabriela Leite) para regulamentar a atividade com o suposto argumento de que a Lei protegerá as mulheres em situação de prostituição. Mas o próprio projeto anuncia seu objetivo: criar uma “Lei que distingue o que é a prostituição e o que é a exploração sexual, institutos confundidos no atual código penal”. Soma-se a isso o fato de que há no Senado um projeto de Reforma do Código Penal, que acaba com a punição para os proprietários de prostíbulos.

O código penal brasileiro, hoje, em seu artigo 228, proíbe qualquer tipo de exploração sexual. O PL 4211/12 propõe que exploração seja entendida como o não pagamento, coação e apropriação total ou maior que 50% do rendimento da prestação sexual por terceiro. Ou seja, abaixo de 50% do valor total do serviço, seria permitida a apropriação do pagamento por outrem, não sendo considerada exploração sexual.

Os projetos de regulamentação da prostituição buscam criar padrões mínimos para a exploração sexual, tornando-a oficialmente aceitável em troca de direitos trabalhistas para as mulheres prostituídas e, supostamente, mais segurança e higiene para elas. No entanto, a prostituição não precisa ser regulamentada para que as mulheres tenham acesso à saúde, segurança e políticas públicas específicas, além do dever do Estado em prestar assistência social irrestrita.

A regulamentação apenas servirá para legitimar a violência cotidiana da prostituição, além de legalizar a dos intermediários, popularmente conhecidos como cafetões, assim como os prostíbulos. Ou seja, a exploração dessas mulheres será legalizada, e elas estarão subordinadas às ordens, controle de sua sexualidade e do pagamento do programa, em que parte significativa irá para seus chefes.

Diante destes projetos, vemos que quem vai lucrar com a regulamentação da prostituição serão os grandes empresários do sexo, impondo a lógica do lucro à exploração do corpo e da sexualidade das mulheres. Além disso, a prática passa a ser incentivada como boa alternativa para as mulheres – principalmente jovens, sem experiência e qualificação – eximindo o poder público de buscar alternativas para o desemprego feminino.

Aprofundando o problema, a regulamentação ainda incentiva os mercados intimamente relacionados com a prostituição, como o aliciamento de menores e o tráfico internacional de mulheres e crianças, rendendo altos lucros para os exploradores. 

Regulamentar não significa defender as mulheres prostituídas. Na atualidade, inclusive, podemos tomar como exemplo a expressiva derrota da proteção da vida das mulheres e crianças nos países em que se regulamentou a atividade. A Holanda é o caso mais emblemático: o tráfico de mulheres para este país subiu 260% nos primeiros três anos após a lei regulamentadora, assim como também aumentou a prostituição infantil, segundo pesquisa da Universidade de Rhode Island. O mercado do sexo se tornou mais competitivo, a quantidade de traficantes de mulheres e cafetões cresceu, a lógica do maior lucro com redução de custos se impôs e houve a precarização das condições de trabalho e maior exploração das mulheres prostituídas. O governo holandês perdeu o controle da atividade para a forte burguesia internacional que comanda o mercado e agora discute rever a regulamentação. O agravamento dos mesmos problemas se deu na Alemanha e nos locais da Austrália em que a atividade foi regulamentada.

A prostituição só traz benefícios para a burguesia e é por isso que apoia a regulamentação, na busca desenfreada pelo lucro em cima da escravização do corpo da mulher e na violência. E vê-se que mais uma vez o reformismo deposita suas ilusões no discurso da burguesia, enquanto que as contrapartidas para os trabalhadores mostram-se falaciosas.

Nossa proposta para defender as mulheres em situação de prostituição
Entendemos que a regulamentação legitima a exploração da mulher para garantir altos lucros para a indústria do sexo. Não garante os direitos trabalhistas e sociais necessários a todas as trabalhadoras. E, pior, garante melhores condições para manter legal um comércio muito perverso e lucrativo, vitimiza e escraviza as mulheres pobres trabalhadoras.

A solução, em primeiro lugar, deve começar com a defesa das mulheres em situação de prostituição, para que fiquem menos vulneráveis à polícia e aos cafetões. Devemos imediatamente lutar por políticas públicas e direitos de seguridade social para estas mulheres. Mas junto com isso, ter um programa de emprego e qualificação para que possam ter alternativas à prostituição, para que possam, caso desejem, romper com o ciclo da violência.

Assim, uma saída para defender as mulheres inclui:
  • Garantia de direitos sociais e previdenciários para todas as mulheres, incluindo as que estão em situação de prostituição, assim como defendemos a extensão desses direitos para as trabalhadoras informais, donas-de-casa, desempregadas, pessoas em completa vulnerabilidade social, como forma de reparação social!
  • Construção de Centros de Referência que ofereçam abrigo, formação profissional e direcionamento ao mercado de trabalho para atender as mulheres em situação de prostituição, crianças e adolescentes vítimas da exploração sexual!
  • Política de geração de emprego e renda como alternativa às mulheres em situação de prostituição!
  • Política de capacitação profissional e renda para as famílias das crianças e adolescentes vítimas de exploração sexual!
  • Luta contra todas as formas de violência contra as mulheres em situação de prostituição, principalmente, a violência policial!

    E, acima, de tudo, queremos o fim da Prostituição. Só o socialismo poderá construir as bases de uma sociedade sem classes, sem desigualdade, opressão e exploração, para que a prostituição possa ser definitivamente eliminada. 
  • terça-feira, 9 de outubro de 2012

    McDonald´s: quando o primeiro emprego se torna armadilha para jovens

     



     
    Rede de restaurantes usa da pouca maturidade e fragilidade da juventude para usurpar direitos trabalhistas básicos
     
     
     
    Michelle Amaral,
    da Reportagem do BRASIL DE FATO
     
     
       
       
    Atraídos, jovens são presas fáceis para as irregularidades trabalhistas
    da rede de lanchonetes - Foto: Michelle Amaral

















    Atraídos pela chance do primeiro emprego, milhares de jovens brasileiros procuram a rede de restaurantes fast food McDonald´s para trabalhar. Eles buscam a oportunidade de iniciar a vida profissional e conquistar independência financeira. No entanto, pela pouca maturidade e falta de experiência, esses jovens se veem submetidos a condições irregulares de trabalho e têm usurpados seus direitos básicos.
    “O McDonald´s tem essa imagem do primeiro emprego, [na contratação] eles passam uma coisa totalmente diferente do que é”, afirma Tatiana, que ingressou na rede de fast food com 16 anos e lá viveu uma das piores experiências de sua vida, que lhe traz consequências até hoje.
    Aos 18 anos, Tatiana escorregou no refrigerante que havia escorrido de uma lixeira quebrada, caiu e sofreu uma séria lesão no joelho. Com fortes dores, a jovem foi levada para o gerente da loja. “Ele falou: ‘passa um Gelol e põe uma faixinha que sara’”, relata. Era final de ano, o restaurante estava lotado e Tatiana foi orientada a continuar trabalhando até o final do expediente. Após dois dias, sem conseguir andar, Tatiana procurou o médico, que diagnosticou o rompimento da rótula de seu joelho direito e indicou a necessidade de uma cirurgia. Segundo ela, ao procurar o McDonald´s para informar as consequências da queda, nada foi feito pela empresa que, inclusive, se negou a emitir um Comunicado de Acidente de Trabalho (CAT). “Eu fui ao INSS e perguntei como podia fazer esse CAT. Me deram o papel e mandaram eu ir até o McDonald´s”, conta a jovem, que afirma ter sido orientada pelo gerente a não informar a data correta do acidente para que não resultasse em multa para a loja. Ela ainda denuncia que a gerência sabia do defeito na lixeira, mas não a consertou para evitar gastos, resultando em seu acidente.
    De lá para cá, a trabalhadora viveu sob intenso tratamento médico e teve que procurar reabilitação profissional por meios próprios, já que não podia exercer as mesmas funções e o McDonald´s se recusou a adaptá-la em outra área da empresa. Ela se formou em Direito e realizou estágio em um escritório de advocacia. Com isso, após 11 anos do acidente, Tatiana conseguiu a carta que a declara ser pessoa portadora de deficiência física e dá o reconhecimento de sua reabilitação pelo Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS).
     
       
       
       
    Tatiana passou por três cirurgias e anda com o
    auxílio de uma muleta - Foto: Michelle Amaral
    Hoje, aos 34 anos, Tatiana anda com o auxílio de uma muleta. Já passou por três cirurgias e necessita, ainda, realizar mais uma. No entanto, em março deste ano, ao tentar passar por uma consulta médica para agendar o procedimento, a trabalhadora foi informada do cancelamento de seu plano de saúde. O motivo foi a conclusão em janeiro da rescisão indireta do McDonald´s, solicitada pela trabalhadora em 2009. “O McDonald´s deveria ter comunicado ela [sobre o cancelamento da assistência médica], porque a lei diz isso, mas não comunicou, simplesmente cancelou”, protesta Patrícia Fratelli, advogada da trabalhadora. De acordo com a Lei nº 9.656 de 1998, regulamentada pela Resolução Normativa nº 279 da Agência Nacional de Saúde (ANS), no caso de rescisão do vínculo empregatício é assegurado ao trabalhador “o direito de manter sua condição de beneficiário, nas mesmas condições de cobertura assistencial de que gozava quando da vigência do contrato de trabalho, desde que assuma o seu pagamento integral”. “Eu tinha condição de pagar o meu convênio, o McDonald´s tinha que ter me dado essa opção, porque agora perdi a carência e nenhum convênio vai me aceitar”, desabafa Tatiana, que há quase 16 anos enfrenta uma batalha judicial contra o McDonald´s para ter seu dano reparado.
     
    Armadilha
    O caso de Tatiana não é isolado. Tramitam na Justiça do Trabalho na cidade de São Paulo e região metropolitana 1.790 ações contra o McDonald´s e a Arcos Dourados Comércio de Alimentos Ltda., franqueadora master da multinacional no Brasil e na América Latina. Somente na capital paulista são 1.133 demandas judiciais ativas por conta das irregularidades trabalhistas e o tratamento inadequado dado pela empresa aos seus funcionários, conforme levantamento feito junto ao Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região. Entre as falhas cometidas pelo McDonald´s estão o pagamento de remunerações abaixo do salário mínimo, utilização de jornada de trabalho ilegal, falta de comunicação dos acidentes de trabalho, fornecimento de alimentação inadequada, não concessão de intervalo intrajornada, ausência de condições mínimas de conforto para os trabalhadores, prolongamento da jornada de trabalho além do permitido por lei, assédio moral e sexual. Além disso, existem denúncias de jovens que trabalharam sem serem remunerados (leia matéria na página ao lado).
    No Brasil, o McDonald´s emprega hoje 48 mil funcionários, de acordo com informações publicadas em seu site. Destes, 67% têm menos de 21 anos e 89% tiveram na rede de fast food a primeira oportunidade de emprego formal. Questionado pela reportagem sobre os processos movidos contra ele, o McDonald´s disse que “não comenta processos sub judice”.
    Para Rodrigo Rodrigues, advogado do Sindicato dos Empregados em Hospedagem e Gastronomia de São Paulo e Região (Sinthoresp), a oferta do primeiro emprego a esses jovens é pensada pelo McDonald´s a fim criar nesses trabalhadores o sentimento de submissão incondicional, em que o contratado acata tudo o que lhe é imposto, pela gratidão da oportunidade de trabalho. “A pessoa fica com receio de se indispor contra o tratamento que é dado na empresa. Isso é sutilmente pensado para que se chegue a essas finalidades”, alega.
    A mesma avaliação é feita pelo procurador Rafael Dias Marques, coordenador nacional da Coordenadoria de Combate à Exploração do Trabalho da Criança e do Adolescente (Coordinfância) do Ministério Público do Trabalho (MPT). Segundo ele, a necessidade do primeiro emprego e a vontade de começar a vida profissional são vistas por alguns empregadores como uma possibilidade de fraudar direitos que são garantidos a esses trabalhadores por lei. “Muitas empresas preferem contratar os mais jovens para evitar problemas trabalhistas, para torná-los uma massa de manobra mais fácil para executar [o trabalho] sem direitos trabalhistas, sem qualquer questionamento ou um questionamento mais brando”, afirma.
     
       
       
    Empresa utiliza pouca maturidade dos jovens para negligenciar direitos
    trabalhistas básicos - Foto: Michelle Amaral
    O procurador explica, ainda, que a pouca maturidade torna a contratação desses jovens vantajosa para essas empresas. “São pessoas que, por ainda serem jovens, não tem o senso crítico do questionamento e de resistir a determinadas situações de lesões de direitos”, analisa.
     
    Garantia de direitos
    O advogado do Sinthoresp lembra que o jovem tem que ser visto como um ser em transformação, que necessita de cuidados que lhe assegurem uma boa formação para a vida. “O trabalho é uma condição necessária, mas deve ser implementado aos poucos, não pode ser do jeito que está, coloca o jovem lá e vamos ver o que vai dar”, pondera Rodrigues. O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) permite a contratação de adolescentes a partir de 14 anos, na condição de aprendiz, e de 16 anos para o trabalho normal. No entanto, o estatuto estabelece que a eles deve ser observado “o respeito à condição peculiar de pessoa em desenvolvimento”.
    Desta forma, Marques ressalta que a atividade profissional não pode ser prejudicial ao desenvolvimento físico e social destes adolescentes e jovens, seguindo o que estabelece o Decreto nº 6.481/2008. “Eles são pessoas peculiares em desenvolvimento, em fase de formação, por isso que o trabalho nessa fase da vida tem que ser diferenciado”, analisa.
    O procurador alerta que, se não observados os cuidados com esses jovens, o trabalho pode lhes causar danos irreversíveis para a vida adulta. “O risco de lesão à saúde por uma situação do trabalho é muito mais evidente nessa parte da população, porque ainda que está em formação biológica”, observa. Segundo ele, “uma doença do trabalho nessa fase da vida é mais suscetível a ter continuidade, inclusive de levar ao quadro da invalidez”.
    Foi o que aconteceu com Tatiana. Com o acidente ocasionado por uma negligência da empresa, teve sua vida completamente mudada. “ Tive que parar a minha vida. Fiquei um tempo sem estudar. Queria fazer enfermagem e o médico falou que eu nunca poderia ser enfermeira, porque não podia ficar em pé”, conta.
    Rede de restaurantes fast food usa da pouca maturidade e fragilidade da juventude para usurpar direitos trabalhistas básicos

    quarta-feira, 5 de setembro de 2012

    Kátia Abreu ataca direito de greve

    Por Altamiro Borges
    A ruralista Kátia Abreu (PSD-TO), a senadora que mais sabota a votação da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) contra o trabalho escravo, resolveu atacar o direito de greve dos servidores públicos. Em seu artigo semanal na Folha, ela confirmou sua visão escravocrata. Para ela, é urgente regulamentar o artigo da Constituição que trata deste tema, já que “o vazio jurídico tem permitido, algumas vezes, que esse direito seja exercido imoderadamente e sem qualquer limite, com graves danos à sociedade e à economia”.
    A presidenta da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que reúne os maiores latifundiários do país, está preocupada com a onda de greves no setor público. Neste sentido, ela defende que o parlamento aprove com urgência uma lei que restrinja este direito. “Não podemos prosseguir nessa omissão”, adverte. Para ela, “o Estado deve ser o espaço de todos – e não apenas de alguns grupos circunstancialmente poderosos”. Será que Kátia Abreu está fazendo autocrítica do poderoso e mesquinho lobby dos ruralistas?
    A pressão das forças antissindicais
    O artigo da senadora não foi publicado por acaso. Nas últimas semanas, cresceu a pressão midiática pela regulamentação do direito de greve dos servidores públicos. A Constituição de 1988 – também chamada de “Constituição Cidadã” por Ulisses Guimarães –, garantiu pela primeira vez na história, no seu inciso VI, do artigo 37, “o direito à livre associação sindical” ao funcionalismo. Já o inciso VII do mesmo artigo assegurou o direito de greve e determinou que ele “será exercido nos termos e nos limites definidos em lei”.
    Até hoje, o parlamento não definiu estes parâmetros. Ele também nada fez para garantir o legítimo direito à negociação coletiva aos servidores públicos, segundo as normas da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Com a recente onda de paralisações na esfera federal, a direita nativa passou a bater bumbo pela restrição às greves no serviço público. Os jornalões publicaram dezenas de artigos e editorias para satanizar os grevistas, instigando o ira da sociedade. A direita, porém, nada fala sobre o direito à negociação coletiva.
    Retrocesso do governo Dilma
    Neste clima de terror, a presidenta Dilma Rousseff surpreendeu as bases sindicais que a apoiaram ao endurecer nas negociações e ao editar uma portaria que permite a utilização de fura-greves no setor público. Todas as centrais condenaram a iniciativa autoritária do governo. Também neste cenário adverso, o Congresso Nacional decidiu se submeter à pressão da direita – partidária e midiática – e acelerar a votação do projeto de lei 710/2011, do senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), que golpeia o direito de greve no setor público.
    Nesta segunda-feira (3), ocorreu a primeira audiência para tratar do tema no Senado. Segundo relato de Najla Passos, do sítio Carta Maior, o resultado não agradou as forças antissindicais. A audiência firmou dois consensos. “Primeiro, o de que não é possível regulamentar o direito de greve sem, paralelamente, aprovar uma política de reajuste para as categorias. Segundo, o de que o assunto não pode ser discutido de afogadilho, no bojo de um movimento que conta com especial campanha conduzida pela mídia para criminalizá-lo”.
    O lobby dos patrões
    Conforme alertou o senador Paulo Paim (PT-RS), “regulamentar o direito de greve é uma coisa. Proibir é outra. Não podemos avalizar um projeto que inviabilizará a greve para os trabalhadores públicos. O direito de greve foi instrumento até para conquistarmos a nossa democracia e deve ser assegurado a todos”. Até o representante do Ministério do Trabalho, Manoel Messias, concordou que é preciso cautela no debate. “É estranho se regulamentar o direito de greve sem, primeiro, definir as regras da convenção coletiva dos servidores”.
    A ruralista Kátia Abreu, habituada a tratar na chibata os trabalhadores, não deve ter gostado muito desta “cautela”. Isto explica o seu artigo!

    sábado, 18 de agosto de 2012

    Senador Paim faz alerta: Governo vai propor flexibilizar a CLT



    “Está em gestação processo para flexibilizar CLT”, alerta Paim

    do Vermelho, sugerido pelo Marco Aurelio

    Há pouco tempo, o senador Paulo Paim (PT-RS), na tribuna da casa legislativa de que faz parte, alertou: “Estou sabendo que o Poder Executivo pretende enviar ao Congresso Nacional proposta para mudar a legislação trabalhista e criar duas novas formas de contratação, a eventual e por hora trabalhada. Na prática, nós sabemos muito bem o que isso representa: a perda de direitos sociais para os trabalhadores”.
    O alerta do senador Paim não é um delírio, ao contrário. No início deste mês, o jornal Valor Econômico veiculou notícia que a presidenta Dilma Rousseff “prepara para depois das eleições municipais a negociação com o Congresso de duas reformas: a da previdência, em troca do fim do fator previdenciário, e a que flexibiliza a legislação trabalhista, cujo anteprojeto está na Casa Civil e que deverá dar primazia ao que for negociado entre as partes sobre o legislado, ampliando a autonomia de empresas e sindicatos”.
    “Tenho o dever e a obrigação de, a partir desta tribuna e utilizando os meios de comunicação desta Casa, fazer um alerta ao nosso país e à nossa gente. Está em plena gestação um processo para flexibilizar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), a maior conquista social dos trabalhadores brasileiros. Da nossa parte, não aceitaremos, em hipótese alguma, a retirada ou a redução de direitos e de conquistas da classe trabalhadora, forjados na luta cotidiana!”, disse o senador em discurso.
    E anunciou que fará mobilização “a fim de chamar a atenção de todos para o perigo que se avizinha. Não somos profetas do pessimismo e nem temos bola de cristal para prever o futuro. Porém, a história tem nos mostrado que devemos sempre vigiar”.
    “O Ano da CLT”
    O senador encerrou sua fala anunciando que apresentará proposta para que 2013 seja considerado “O Ano da CLT”. Paim afirmou que “não podemos fechar os olhos para a ideia que estão tentando vender para a sociedade e que eu considero um engodo. As possíveis mudanças na CLT não representam modernidade. Ao contrário, elas pretendem desmontar a CLT e acabar com direitos e conquistas dos trabalhadores”.
    A CLT foi criada em 1º de maio de 1943, pelo então presidente Getúlio Vargas e, em novembro, começou a vigorar. Em 2013, completará 70 anos. Ela surgiu de novas demandas do país, que a partir de 1930 deixava de ter uma economia exclusivamente agrícola e passava a se tornar cada vez mais industrial.
    “A mobilização popular e a contribuição de vários intelectuais brasileiros foram fundamentais em todo este processo de progresso social e de proteção ao trabalhador”, destacou Paim.
    Tentativas anteriores
    Na época em que o governo de Fernando Henrique Cardoso pressionava o Congresso para modificar o artigo 618 da CLT, o advogado Benedito Calheiros Bomfim escreveu um artigo sobre o assunto. Na ocasião, ele disse que, em poucas palavras, a proposta era transformar a lei em letra morta, permitindo que uma falsa “livre negociação” fosse superior a ela – o que é totalmente inconstitucional, por razões óbvias.
    “De que vale uma lei que, além de permitir transgressões a si mesma (não como exceção, mas como regra), também permite transgressões ao artigo 7º da própria Constituição? Imaginemos se a Lei Áurea ‘permitisse’ aos escravos ‘negociar’ sua continuação como escravos.”
    O ex-presidente Lula, logo após assumir a Presidência da República, em 2003, mandou retirar do Congresso o projeto de Fernando Henrique.

    Da Redação em Brasília
    Com informações do Diap

    domingo, 12 de agosto de 2012

    "Austeridade" é péssimo argumento contra greves do funcionalismo



    A presidenta Dilma Rousseff fez nesta sexta-feira (10) declarações que podem acirrar ainda mais os ânimos com o funcionalismo público em greve. Segundo ela, a prioridade do governo neste momento é manter as vagas dos trabalhadores que não têm estabilidade no emprego. Referindo-se à posição do governo de não atender as reivindicações dos grevistas, ela disse que o momento é de austeridade fiscal.

    Por José Reinaldo Carvalho, editor do
    Vermelho


    “Estamos enfrentando uma crise no mundo e o Brasil sabe, porque tem os pés no chão, que pode e vai enfrentar a crise e passar por cima dela, assegurando emprego para todos os brasileiros”, afirmou, ressaltando que o governo tem priorizado medidas destinadas a setores capazes de incentivar a economia. “O que o meu governo vai fazer é assegurar empregos para aquela parte da população que é mais frágil, não tem direito a estabilidade, porque esteve muitas vezes desempregada”. As afirmações foram feitas em cerimônia de ampliação do Programa Brasil Sorridente, em Rio Pardo de Minas (MG).

    Mais de 350 mil funcionários públicos estão em greve em todo o país. Os ânimos estão exaltados do lado das autoridades e de setores do movimento sindical. As relações entre as partes nunca estiveram tão deterioradas, ao ponto de a Central Única dos Trabalhadores e outros cinco sindicatos de servidores públicos terem decidido representar contra o governo na Organização Internacional do Trabalho (OIT). A representação acusa o governo de atitudes antissindicais.

    A presidenta da República com certeza sabe o que diz e não há a menor sombra de dúvidas de que o que ela pretende assegurar é o melhor para o país. Conta com o crédito da população que a sufragou maciçamente nas eleições presidenciais e lhe confere elevados índices de aprovação.

    Mas é preciso dizer que há muitos erros na postura do governo. Primeiramente, ao determinar o corte do ponto dos grevistas e decretar que os servidores públicos federais paralisados sejam substituídos por funcionários estaduais ou municipais equivalentes, o governo federal desrespeita o direito de greve e dá uma demonstração de intolerância.

    É indispensável uma postura democrática e um diálogo efetivo. De nada adianta enviar ministros ou funcionários subalternos para negociar com os grevistas se eles repetem monocordicamente o argumento de que as finanças públicas não suportam o atendimento das reivindicações salariais.

    Em segundo lugar, a austeridade fiscal não é argumento para ignorar as reivindicações salariais do funcionalismo. Se há um aspecto condenável na política macroeconômica vigente é precisamente o arrocho fiscal, porquanto o objetivo precípuo ao adotá-lo é assegurar os ganhos obtidos pelos credores do Estado na ciranda financeira.

    Outros argumentos e outras posturas poderiam sensibilizar mais os trabalhadores em greve e o movimento sindical do setor público. Estes sabem que as defasagens salariais estão acumuladas há muitos anos e são uma herança maldita do governo neoliberal, conservador e fiscalista de Fernando Henrique Cardoso. Com certeza, terão sensibilidade e espírito  público para negociar.